16 de março de 2012

Jornada Nacional de Literatura - parte 3 & La interminable Caperucita



O tema era “Formação do leitor contemporâneo”. O palco, a 14ª Jornada Nacional de Literatura, em Passo Fundo – RS, realizada em agosto de 2011.

Presenciei ali um acalorado debate entre Alberto Manguel – escritor argentino, unanimidade quando o tema é leitura, autor de obras como “Uma história da leitura”, – e Kate Wilson, editora britânica (para mim, até então desconhecida).

A editora (de livros impressos, ebooks e aplicativos) defendeu a idéia de que a literatura deve se servir das interfaces que as novas tecnologias digitais oferecem para garantir acesso às obras literárias. Na ocasião, mostrou uma versão interativa do clássico “Cinderela”, em que as crianças podem escolher “ler e jogar”, “ler para mim” e “ler sozinho”.

O argentino reagiu, dizendo que não estava ali para debater sobre “deformação” de leitores e que introduzir as crianças na leitura usando esses aplicativos era muito nocivo. “Aprender a ler é outra coisa”, completou Manguel.

Os outros integrantes da mesa e a plateia fomentaram uma das melhores discussões do evento, deixando questões: as mídias digitais possibilitam novas formas de leitura? a literatura deve “explorar” o que essas mídias oferecem?

Uma boa resposta encontramos no site de Ângela-Lago, escritora e ilustradora de literatura infantil e, em especial, na obra “La interminable Caperucita” (nem tão interminável assim, depois de alguns cliques as opções se esgotam!).


Esse intertexto (uma releitura de “Chapeuzinho Vermelho”) se apresenta como um jogo, em que a autora usa imagens, movimentos, sons e os leitores devem escolher os caminhos.

A história é pautada por animações, sem palavras (aí, brilha o talento da ilustradora!).

Logo na primeira cena, a mãe orienta a filha; esta parece concordar com os combinados.

Assim que clicamos em Chapeuzinho, dois caminhos surgem: um representado por uma seta verde e reta; outro, por uma seta amarela e sinuosa. Bastante sugestivas as formas das setas...

A verde mostra o Lobo, de pijama de bolinhas (ironia irresistível!), “abatido” pela menina que, assim, se dirige à casa da avó sem risco nenhum.

A opção pela seta sinuosa revela uma menina distraída com flores, borboletas; o lobo (de pijama de bolinhas!) ganhando tempo, pegando a vovó, a entrada dos caçadores... versão mais próxima da “original”.

No final dos dois caminhos, há um elemento surpresa: um livro que é lido pelo Lobo e, parece, a partir do qual orienta a menina na volta para a casa.

E há (surpreendentemente, mais uma ironia?!) a música: “La vie em rose”, entoada por Chapeuzinho enquanto anda pelos caminhos, talvez, uma metáfora da vida sossegada (cor de rosa) da menina ou, quem sabe, a antevisão de um amor irresistível?!

Quem  não gostaria de ler essa obra? Quem recusaria o jogo com a Chapeuzinho e o Lobo?

Leitura, seja em que suporte for, é interação entre obra, autor, leitor, contexto de produção, possíveis sentidos, marcas  ideológicas... As tecnologias digitais, penso, explicitam essas relações.

Sim, senhor Manguel, sou atrevida: leitura é não é, apenas, outra coisa, mas muitas coisas. 
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 Para saber mais sobre o debate na Jornada:
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Esse texto enviei para cumprir a tarefa "escrever uma resenha sobre um produto cultural", do curso Sequência didática: aprendendo por meio de resenhas, promovido pelo Cenpec - Olimpíada de Língua Portuguesa

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